quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Arte brasileira exposta em 10 polegadas

Os primeiros passos e rabiscos dos capistas da terra do samba - Por Egeu Laus*

Em janeiro de 1951, foi lançado no Brasil o primeiro disco fonográfico de 33 rotaçoes e 1/3 por minuto, inaugurando um formato que revolucionou a maneira de ouvir, produzir e distribuir música no país. A era do long-playing, o popular LP, começava.

Lançada pela americana Columbia, em 1948, duas tecnologias novas se uniam naquele momento: o suporte fonográfico (o disco), que passava a ser produzido em vinil; e a tecnologia de gravaçao em microssulco, que diminuía a rotaçao dos discos para menos da metade dos 78 de entao.

Com a possibilidade de inserir oito a 12 músicas num disco, em vez das duas dos tempos do 78 rpm, mudanças importantes aconteceram: o surgimento da "obra" musical, com cançoes unidas por um mesmo conceito, e uma novidade que construiria uma nova cultura para o ouvinte: a capa de discos.

No Brasil, onde a arte ligada à música existe há meros 50 anos, é impressionante o nível atingido. Nao à toa, no final dos anos 80, a conceituada revista americana Print, especializada em artes gráficas, editou número especial sobre o design gráfico brasileiro, com destaque para as capas de discos.

No primeiro período, o LP nacional era o vulgo "10 polegadas", com 25 centímetros de diametro e quatro faixas de cada lado. O formato desapareceu em 1958 e deu espaço ao LP, que existe até hoje: 12 polegadas de diametro (31 centímetros) e 6 faixas, em média, em cada lado.

Mas o fato é que em 1951 tudo ainda engatinhava. O primeiro LP lançado pela Sinter (distribuidora da Capitol americana), Carnaval da Capitol, era uma compilaçao para as festas daquele ano. Seu desenhista, Paulo Breves, se tornou o primeiro capista de discos do Brasil. Ele também ilustrou Parada de Sucessos, em 1952, e continuou ativo até a década de 1960 na gravadora, que mudou várias vezes de nome e hoje atende por Universal.

As primeiras capas costumavam exibir ilustraçoes, já que grande parte dos discos era de compilaçoes de sucessos já lançados em 78 rpm (formato que resistiu até 1964). E, quando falamos em "capas", era só isso mesmo. As contracapas nao faziam parte do trabalho do capista (encartes e envelopes seriam produzidos apenas na década de 1970). e nao havia projeto gráfico integrado. Contudo, trabalhos magníficos foram produzidos, como o de Lan para a A Velha Guarda, de Pixinguinha, com Donga, Joao da Bahiana e Almirante (pela Sinter) em 1954.

os artistas plásticos foram bastante atuantes naquela década, principalmente em torno do intelectual Irineu Garcia, da gravadora Festa, considerado o primeiro selo "independente" do Brasil. Atos Bulcao, Lygia Clarck e Darcy Penteado foram alguns dos que ilustraram os discos de poesia da Festa, como o de Cecilia Meireles e Guilherme de Almeida, de 1955, feito por Di Cavalcanti. Mais adiante, a novidade foi a utilizaçao de fotos produzidas em estúdio, pelas maos da célebre dupla Joselito (design) e Mafra (fotografia), da gravadora Musidisc.


*Egeu Laus é designer e pesquisador da memória gráfica brasileira

(Publicado originalmente na revista Bizz, ediçao especial "100 Maiores Capas De Discos De Todos Os Tempos", maio de 2005)

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